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SOBRE URSOS E MUSEUS: COMO TUDO COMEÇOU

Washington e o Louvre

Apresento a vocês o Washington, muito elegante, sentado ao lado de uma belíssima edição do livro “Building The Louvre”.

Para que eu fizesse esta foto se passaram mais de vinte anos, entre a chegada do meu amigo felpudo e o livro deste museu que pude conhecer o ano passado. Ambos marcam momentos de busca e de inspiração.

Era bolsista em Washington, capital dos Estados Unidos, quando uma vez no mercado, fazendo compras, vi alguns ursos de pelúcia aglomerados numa cesta com um cartaz de venda. Estava num trabalho de pesquisa difícil, longe de casa, aquele misto de alegria e sofrimento que todos que migram em algum momento da vida sentem. Não resisti e fui para o caixa muito feliz, com legumes, enlatados, produtos de limpeza e um urso. Só que não havia feito as contas direito, estava aguardando chegar o pagamento da bolsa de estudos, e tive de deixar a maior parte das compras com o caixa. Lembro até hoje do seu rosto, tentando fazer as contas comigo, para ver se eu conseguia levar mais alguma coisa. Não levei. Deixei quase tudo ali no balcão. Apenas o urso, com muito cuidado, levei de volta ao cesto, acomodei bem confortável num cantinho, e disse baixinho que me esperasse, voltaria para buscá-lo em breve. Fiz uma marquinha, para ter certeza tanto para mim como para ele, que não nos perderíamos um do outro.

Dias depois voltei ao mercado, a primeira parada foi no cesto e, lá estava ele! E fomos juntos para o rapaz do caixa, que nada disse, mas pelo seu olhar lembrou do ocorrido, e com um sorriso abençoou minha saída com Washington. O nome se explica pela cidade em que morava por conta da pesquisa. Até hoje ocupa um lugar no meu coração, pelos seus museus, pela diversidade de vida que existe e persiste. Mesmo sendo um lugar de poder, de coisas e situações complicadas, pude presenciar lutas por direitos humanos, o acesso pleno à cultura, aos museus, bibliotecas e espaços culturais os mais diversos. Foi onde compreendi que poderia e queria dedicar minha vida aos museus e à arte.

Muitos anos depois, entre as batalhas que todos enfrentamos pelo que acreditamos, pude finalmente conhecer o Louvre e as obras de arte que sempre vi nos livros, referências de história da arte. Este livro que fotografei retrata por meio de uma série de ilustrações as diversas mudanças que o Louvre sofreu ao longo dos anos, de um pavilhão de caça a um museu de arte mundialmente conhecido.

Exatamente por ter um percurso, por ter feito muitas descobertas quando estive fora, o que aprendi e continuo aprendendo no Brasil é de um valor inestimável. Sempre tenho de olhar, lembrar e agradecer o reconhecimento, o afeto e o apoio recebidos ao longo do caminho por amigos, professores, mentores, colegas de trabalho.

Uma forma de retribuir e agir dentro de algo que me inspira deu origem ao projeto Urso no Museu. Procurava um modo de construir pontes de diálogo entre funcionários de museus e seus públicos, pelo afeto, pela troca de saberes e da afirmação de valores como diversidade, igualdade e cultura.

Venho trabalhando nisto há dois anos, ainda engatinhando, mas com um olhar sereno e firme no futuro.

Como todo o projeto do site O Cubo Azul, o Urso no Museu também tem e terá o tamanho de minhas pernas e meu fôlego. E olha que eu tenho feito uma caminhada bem interessante. Talvez falte um pouco de modéstia, mas dedicação, amor e convicção nunca.

Fica então o convite para as cenas dos próximos capítulos.