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Tecendo a ponte com a poesia e a realidade: Rosana Paulino.

Tecelãs, 2003. Instalação. Faiança, terracota, algodão e linha sintética. Coleção particular.

Vemos aqui a obra “Tecelãs”, instalação de 2003 da artista Rosana Paulino (SP, 1967), que fez parte da exposição “A Costura da Memória”, apresentada entre dezembro de 2018 e agosto de 2019 na Pinacoteca de São Paulo e no Museu de Arte do Rio de Janeiro.
Tive a oportunidade de visitar as duas exposições e constatar a potência ao mesmo tempo poética e de confronto da artista Rosana Paulino.
Esta instalação apresenta um conjunto de pequenas criaturas, que tomo a liberdade de denominar como um misto de mulheres e bichos da seda, que saíram de seus casulos, que estão no chão e se puseram a tecer.
A visão do conjunto e de cada pequena tecelã são de uma delicadeza e força impressionantes. Conforme relatado pela artista, foram necessários cálculos para garantir que o peso das peças instaladas não sobrecarregasse a parede.
Rosana Paulino possui formação artística sólida e tem um trabalho de pesquisa que inclui o estudo na natureza dos processos de transformação como dos casulos. Esta transição é aparentemente delicada mas de uma violência única, pensando na lagarta, que já borboleta, rompe a crisálida para uma nova existência.
As tecelãs de Rosana procuram a transformação, unidas apresentam sua condição feminina e esta necessidade imperativa cotidiana pela mudança, pelo reconhecimento da mulher no mundo e no dia a dia.
Há uma forca silenciosa que nos envolve e nos coloca internamente a tecer em nós um questionamento sobre o que podemos mudar hoje, para que amanhã seja de fato novo.
Esta energia vital permeia toda a obra da artista. Utilizando a delicadeza de seus desenhos, bordados, pequenas esculturas, nos coloca sempre diante da sua condição de mulher, negra, brasileira. Cabe ao espectador / público estabelecer uma conexão, seja vendo a si mesmo representado ou reconhecendo a humanidade de uma séria de condições desumanas.
A indiferença nunca será uma opção, porque suas obras funcionam como um espelho. E se tratando de espelhos, podemos mentir a todos, mas nunca a nós mesmos.
Para que possamos tecer novas, melhores e mais belas histórias.

Tecelãs, 2003. Instalação (detalhe da obra). Faiança, terracota, algodão e linha sintética. Coleção particular.